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Para uma situação de insustentável inflação, a resposta do Banco Central Europeu (BCE) é aumentar as taxas de juro, as vezes que forem necessárias disse a representante do FMI, perdão, a representante da Wall Street, bolas, a Presidente do BCE – Christine Lagarde.
Segundo ela e mais um bando de economistas neoliberais de quinta categoria e outros tantos comentadores que pululam no espaço mediático (sem o mínimo de conhecimentos em Economia), esta é a única resposta possível. De facto, as primeiras aulas de Economia I ensinam que o aumento das taxas de juro é “a medida”, por excelência, que melhor permite combater a inflação. O problema é que a maioria das Leis da Economia provém de um tempo em que os mercados funcionavam de forma genuína, em que havia lógica e probidade nas mais diversas interacções económicas. Daí resultava a elaboração de teorias económicas que permitiam estabelecer regras para o bom funcionamento dos mercados.
Contudo, há muito tempo que o capitalismo desenfreado transformou os mercados em algo artificial, sem lógica económica ou social, plenos de perversidade e fora de qualquer controlo. Por exemplo, a actual situação de elevada inflação não decorre do funcionamento normal dos mercados, pelo que o aumento das taxas de juro não trará nada de bom à sobrevivência das famílias e das empresas. Faria todo o sentido aumentar as taxas de juro se este elevado aumento da inflação se devesse a um brutal aumento do poder de compra dos consumidores e consequente elevada procura de bens, mas não é o caso. Ou seja, não se verifica um aumento da procura que justifique este nível de inflação, nem sequer existe uma diminuição do lado da oferta. O que pode haver, pontualmente, é alguma instabilidade no acesso a algumas matérias-primas, mas que também não justifica esta inflação. Aquilo que tem vindo a acontecer é um brutal aumento da energia que, naturalmente, conduz ao aumento dos custos de produção e inevitavelmente ao aumento do preço dos mais diversos bens e serviços. Mas aquilo que está realmente a acontecer é que os aumentos desenfreados nos preços – começando logo pelos preços da energia – não têm correspondência com qualquer lógica sana de mercado ou com qualquer lei económica. Os aumentos verificados nos combustíveis e na energia estão brutalmente inflacionados. E a partir daí, todos os agentes económicos superinflacionam os preços fazendo com que os preços ao consumidor final sejam muito superiores ao que deveriam ser, mesmo considerando as eventuais flutuações de preços nas matérias-primas.
Portanto, estes valores brutais de inflação provêm da especulação e da ganância de quem tem o poder de fixar os preços. E é por isto que o aumento das taxas de juro não vai resolver o problema.
Vejamos, quando se aumentam as taxas de juro, o que é que realmente acontece? Por exemplo, a compra de casa fica muito mais difícil, porque se a taxa de juro é mais elevada, as pessoas vão ver as suas prestações mensais à banca significativamente aumentadas. Portanto, se aumentarmos as taxas de juro, o preço das casas também vai aumentar, o número de pessoas/famílias que querem comprar casa vai diminuir, menos casas se vendem, menos casas se constroem, menos pessoas necessárias para desempenhar todo o trabalho associado à construção e produção de artigos para equipar as casas, ou seja, estaremos a criar mais desemprego, mais crise em cima da crise.
Mas não é apenas isso que vai acontecer. O problema associado à compra de habitação é aquele que mais sobressai, mas outras áreas de actividade serão severamente afectadas. Outro exemplo, a compra de automóveis também vai cair drasticamente, pela mesma razão – as prestações mensais serão muito mais elevadas. Resumindo, tudo aquilo que são compras a crédito sofrerão um elevado aumento devido ao aumento da taxa de juro. Isto constitui um autêntico pesadelo para muitas famílias e empresas.
Falando nas empresas, estas apresentam uma dívida acumulada extremamente elevada, muito por causa da política monetária seguida pelo BCE há já vários anos. Se bem se lembram, o senhor Draghi baixou as taxas de juro para zero, ou até mesmo para valores negativos (virtualmente negativos). Isto fez com que as empresas – sobretudo as empresas – corressem desenfreadamente ao crédito, porque não apresentava custos (juros). Ou seja, ao longo de vários anos, as empresas acumularam um astronómico valor de dívida que agora terá um custo insuportável com a subida das taxas de juro. É fácil de antever que muitas empresas não vão conseguir cumprir com as suas obrigações, muitas irão falir certamente. Ou então, para se aguentarem vão aumentar ainda mais os preços dos seus produtos e serviços, numa tentativa desesperada de poder pagar a dívida acumulada, causando ainda mais inflação.
Então e o Estados? Os Estados também têm dívida acumulada – e no caso de Portugal não é nada pequena. Os Estados também têm que ter dinheiro para fazer face às suas obrigações. Já sabemos o que os governos costumam fazer nestas situações, não sabemos? Claro que sabemos, os governos vão aumentar impostos e cortar na despesa (onde se inclui o serviço de saúde, de educação, segurança social, infra-estruturas, etc.), só para poder pagar (e como!) aos senhores do costume.
Resumindo, estamos a ser novamente levados – como cordeirinhos da Páscoa – em direcção àquela rua escura sem saída que estamos fartos de conhecer. Aquela rua que esbarra sempre na gigantesca parede plutocrática para a qual o sistema capitalista sempre nos conduz. A parede que nos esmaga, nos oprime e nos suga até ao tutano.
E há sempre uma desculpa falsamente sustentada nas Leis da Economia, que não se aplicam a mercados viciados. Ora é uma qualquer crise com um nome bonito, ora uma pandemia, agora é a guerra. Tudo serve sempre para justificar a necessidade de fazer fluir o dinheiro para as manápulas da mesma meia dúzia de sanguessugas de sempre.
E o mais desesperante é notar que os políticos não estão minimamente interessados em resolver o problema. Políticos que não passam de paus-mandados dessa meia dúzia de sanguessugas que comandam o mundo. Nos últimos anos, o sector farmacêutico (big pharma) acumulou e continua a acumular lucros nunca antes vistos, as empresas de energia também estão a lucrar como nunca, a indústria de armamento segue a mesma linha, só faltava mesmo canalizar uma fatia desses sórdidos fluxos monetários para os senhores da banca. Pronto, com o aumento das taxas de juro, também terão direito a sugar a sua parte. Convém ainda adicionar as empresas tecnológicas e os grandes grupos de comunicação social que seguem sempre de mãos dadas com o poder capitalista que os comanda.
Então qual é a solução? A solução passa inevitavelmente por mudar o actual sistema, algo que a referida meia dúzia de predestinados que controlam as economias mundiais nem querem ouvir falar. E tudo farão para garantir que isso nunca vai acontecer. E é-lhes tão fácil, não é? Basta-lhes continuar a comprar e a plantar nas cadeiras do poder a habitual corja de políticos que tomam as decisões em seu favorecimento.