A “realidade” (agora) menos cega do Daniel Oliveira
No seu artigo de opinião publicado ontem, Daniel Oliveira (DO) demonstra que – finalmente - terá levantado um pouco a pala de um dos olhos, menos mal. Contudo, ficou bem evidente que mantém a outra pala bastante cerrada.
Nota-se que o Daniel Oliveira não quer que lhe atirem com a chancela “pró-Putin”, por isso começa logo por adiantar que desde o primeiro dia desta guerra defende o apoio militar e político à Ucrânia. Daniel Oliveira - que está ao serviço da “liberdade de impresa” – sabe que tem de fazer sempre este disclaimer (uma espécie de isenção de responsabilidade), não vá o diabo tecê-las, como diz o povão.
Daniel Oliveira, que por acaso também é jornalista, escreveu que recusa o “jornalismo fardado”. Pois ninguém diria, considerando as inúmeras vezes que o DO vestiu orgulhosamente a t-shirt caqui para falar do conflito na Ucrânia.
Agora, 19 longos meses depois da invasão, o DO reconhece que “a Ucrânia não pode vencer esta guerra de forma inequívoca”, mas ainda deposita toda a sua crença no facto de que a Ucrânia a pode vencer de alguma outra forma e que “está a lutar por um impasse que lhe dê condições negociais mais favoráveis”. O Daniel Oliveira ignora ou faz de conta que ainda não tomou conhecimento de que a Rússia tentou um acordo com a Ucrânia em Dezembro de 2021 (antes da invasão). O Daniel Oliveira também ignora que no final de Março de 2022, a Rússia voltou a apresentar uma proposta para um acordo de paz, que a Ucrânia recusou. Urge perguntar ao senhor Daniel Oliveira (e todos quantos pensam como ele) se entende que a Ucrânia está, agora, em melhores condições para negociar a paz. E até quando vai continuar a alimentar a crença de que quanto mais durar o conflito, maiores as hipóteses de a Ucrânia se encontrar em melhores condições negociais.
Pois. O Daniel Oliveira decidiu, agora, levantar um bocadinho a pala que lhe cobre um dos olhos, mas continua a observar uma realidade muito deturpada, que o próprio não se coíbe de propagar nos muitos fóruns onde vigora a “liberdade de impresa”.
A realidade – não aquela que o DO enxerga com metade de um olho – é que a Rússia atingiu praticamente todos os objectivos a que se propôs no início da invasão. A Rússia tomou conta de cerca de 20% do território ucraniano, logo no início da invasão. A parte do território onde uma enorme franja da população é de etnia russa e que era perseguida, violentada e, em muitos casos liquidada, desde o golpe de estado que os EUA perpetraram em 2014. Factos que o DO não faz caso e/ou nega.
Relembremo-nos que a Rússia nunca disse que iria tomar a Ucrânia para si, isso é pura ficção e propaganda ocidental, à qual o DO aderiu com muito afinco. Como é possível alinhar com tamanha patranha? Qualquer idiota com meio neurónio a funcionar só ao fim-de-semana, facilmente se apercebe que se trata de uma narrativa sem pés nem cabeça. A Rússia foi muito clara quando disse o que pretendia no início da invasão: impedir a entrada da Ucrânia na OTAN, desmilitarizar e desnazificar a Ucrânia. Todos estes objectivos estão praticamente cumpridos. Isto é que é ser realista e não a imputação de objectivos falaciosos às intenções da Rússia, que é o prato do dia (e da noite) na comunicação social que o DO tanto serve. Eu também poderia dizer que o DO sempre teve o objectivo de se tornar no responsável editorial de todos os órgãos de informação deste país e de vencer o prémio Pulitzer todos os anos, para depois logo concluir que, após mais de 30 anos de carreira, o Daniel Oliveira é o maior flop que o jornalismo já testemunhou.
Neste momento, o conflito resume-se às tentativas 100% frustradas de os ucranianos tentarem recuperar o território perdido. Ao contrário do que é propagandeado pela comunicação social, a famosa contra-ofensiva ucraniana – que dura há meses – não consegue sequer beliscar a primeira linha defensiva russa. Os ataques à armada russa no Mar Negro não passam de fábulas que saem de dentro de cabeças totalmente desesperadas e as tentativas (com muito sucesso, dizem eles) de a Ucrânia recuperar a Crimeia são de chorar a rir. Esta é a realidade.
Mas o DO continua a defender o apoio militar à Ucrânia, mesmo depois de ser tão evidente que defender o envio de mais armas para Ucrânia representa, apenas e só, defender os sórdidos interesses do complexo militar-industrial. Quem diria que o “esquerdista” Daniel Oliveira se tornaria num peão de brega ao serviço da indústria das armas e da guerra? Mais armas para a Ucrânia significa jorrar milhares de milhões do erário público para a indústria de armamento. Significa também que todas essas armas irão ser derretidas no campo de batalha (o que muito agrada à indústria de armamento, pois mantém o seu infindável ciclo de produção e venda) e, pior do que tudo isso, que muitos milhares de ucranianos irão continuar a perder as suas vidas. Esta é a realidade. A realidade que o DO defende.
Por muitas armas, por muito apoio político, por muitas mentiras que se inventem e por muitas duras verdades que se tente ocultar, a Ucrânia nunca teve e nunca terá a mínima hipótese de vencer a Rússia, nem mesmo de conseguir qualquer vantagem negocial. E quanto mais se alongar o conflito, piores as condições negociais para a Ucrânia. Esta é que é a dura realidade que o DO continua a não querer ver e a dissimular perante a sua audiência de crentes.
E nem me vou alongar ainda mais, com todos os nefastos efeitos que a narrativa falaciosa ocidental e as escabrosas decisões dos políticos estão a causar na vida dos seus cidadãos, que intelectualmente entorpecidos pelos poderes instituídos continuam a acreditar que tudo isto tem a ver com direitos humanos, liberdade e democracia. E que estamos todos a esforçarmo-nos por defender todos esses valores. Santa ignorância e santa ingenuidade.
Ou então, se calhar não há nada de errado na opinião do DO. Talvez se trate apenas de uma visão ingénua e crédula. O Daniel Oliveira também acredita que, todos os anos, o Sporting vai ser campeão, mesmo quando a realidade demonstra que nos últimos 40 anos isso só aconteceu três vezes.
Haja fé. Por acaso, acho que ele até é ateu…