Mais um lamentável episódio de leviandade
Até ontem, as autoridades portuguesas da saúde garantiam muito solidamente que não havia nenhuma razão para suspender a administração da vacina da AstraZeneca, mesmo depois de vários países o terem feito, por haver suspeitas de que pode causar coágulos e diminuição das plaquetas sanguíneas, algo que se verificou em várias pessoas a quem foi aplicada esta vacina.
De um momento para o outro, sem que houvesse qualquer novidade sobre o assunto, a DGS e o Infarmed mudaram radicalmente de posição e decidiram fazer uma pausa na vacinação com esta vacina, alegando o princípio da precaução. Notem bem! Precaução. Não é precipitação. Isso foi o que outros países tiveram, tais como a Dinamarca, a Noruega ou a Islândia. Uns piegas, como dizia o outro.
A verdade é que, quer o Infarmed quer a DGS, não têm qualquer competência nesta matéria (e não só). Não estão à altura de garantir o que quer que seja e só tomaram esta decisão porque seria muito difícil manter a posição inicialmente assumida, principalmente depois de países como Alemanha, França, Itália e Espanha também o terem feito. O problema reside no facto de aquilo a que se chama “autoridade do medicamento” e aquilo a que se chama Direcção-Geral da Saúde defenderem acerrimamente uma coisa de manhã e mudar radicalmente de posição à tardinha, sem que houvesse alteração dos factos.
Falando em factos, foram detectados dois casos em Portugal, que estas duas autoridades garantem nada ter a ver com os casos ocorridos noutros países. Bem, com o capital de credibilidade que têm amealhado, nós só podemos acreditar que é verdade.
Estas duas instituições, pela boca de Graça Freitas e Rui Santos Ivo - que as representam - dizem que não há razão para alarme, uma vez que estas reacções extremamente graves são também extremamente raras. Bem, eu fiquei logo descansado, porque se é extremamente raro, não há-de acontecer a mim certamente, há-de acontecer a outro qualquer.
Infarmed e DGS também garantem que não há um nexo de causalidade entre a vacina da AstraZeneca e as reacções graves reportadas. Também a OMS afirma que não há nenhum estudo que confirme a correlação entre uma coisa e outra. Portanto, como referi há já algum tempo, agora a ciência faz-se pela falta de evidências. Portanto, o mais importante não é haver estudos fidedignos que garantam que não há nenhuma relação entre a vacina e as reacções verificadas, o importante é que não haja nenhum estudo que prove que há relação. Bonito. Entramos na era da ciência da não evidência.
Alegam ainda que a taxa de reacções adversas verificadas na população que “tomou” esta vacina não é superior à taxa verificada habitualmente no resto da população. Hum… Será verdade? Então, podemos assumir que as pessoas que “tomaram” as outras vacinas também apresentaram as mesmas reacções, na mesma proporção? Pois…