No cinquentenário do 25 de Abril, uma assembleia de fascistas
Demoraram 49 anos para sair do armário
Dizem que o 25 de Abril (de 1974) pôs fim ao fascismo e à ditadura em Portugal. Não concordo. Tantas décadas de fascismo - anteriores ao 25 de Abril - criaram muitas raízes, muitos vícios, muitas teias de poder e, para piorar ainda mais a situação, criou um marasmo nas pessoas, uma incrível incapacidade para reagir, para protestar e uma inacreditável capacidade para aceitar “o que vem de cima”. O 25 de Abril de 1974 foi apenas o primeiro dia de uma revolução que teria de ter continuado por muito tempo, porque o sistema fascista vigente durante quase 50 anos não se apaga apenas com a destituição das pessoas que estavam no governo. Desde logo, porque o poder não é algo que se reduza a uma só pessoa, ou a um reduzido grupo de pessoas, mesmo num sistema ditatorial. Para que uma ditadura prospere é necessário a envolvência directa de muita gente nesse sistema.
Não finjamos que em Abril de 74 o problema do país era apenas o Marcello Caetano e meia dúzia de apaniguados. Não. Existiam milhares de pessoas nas Forças Armadas, nas polícias, nas mais diversas instituições públicas e em muitas organizações privadas que eram peças fundamentais na manutenção do sistema fascista e ditatorial vigente.
O 25 de Abril serviu apenas para dar o primeiro passo, ou seja, destituir o governo fascista de Marcello Caetano. Mas isso serviria de pouco, se não se implementasse um processo revolucionário que defendesse o interesse do povo e que limpasse a quadrilha de patifes que viveram protegidos e abastadamente favorecidos, debaixo da aba do fascismo. Para onde será que toda essa gentalha foi? O que lhes aconteceu?
Portanto, a revolução iniciou-se no dia 25 de Abril de 1974, mas teria de continuar por muito tempo, pois não é num só dia, ou num só ano que se procede à limpeza das instituições e à implementação de um sistema democrático, onde imperem a igualdade, a liberdade e a justiça social. E, desenganem-se aqueles que ainda consideram que pelo facto de existirem eleições “livres” (não são tão livres quanto isso) existe democracia.
No pós-25 de Abril deu-se a tentativa de implementação do processo revolucionário, mas já se sabia que os fascistas não se iriam entregar às condições do sistema democrático sem que tivessem a garantia de que os seus privilégios – adquiridos e proficuamente fomentados durante longas décadas de ditadura – iriam manter-se intocáveis.
E foi para isso mesmo que serviu o 25 de Novembro – para garantir que a tralha fascista se transporia “suavemente” para o regime democrático, sem ter que perder qualquer um dos privilégios adquiridos e, acima de tudo, sem ter que responder perante a justiça, por todos os crimes cometidos ao longo de décadas.
O 25 de Novembro matou o 25 de Abril e quase todos os seus desígnios. E, por essa razão, vemos os saudosistas do tempo da ditadura a comemorar o 25 de Novembro. O 25 de Novembro não passa de um majestoso indulto colectivo atribuído aos fascistas que subjugaram, oprimiram e exploraram o povo português durante quase 50 anos, e que ainda serviu para os perpetuar no poder por pelo menos mais 50 anos. É só olhar para a Assembleia da República – a suposta Casa da Democracia – e ver o rol de fascistas que por lá desfilam.
A questão da celebração solene na Assembleia da República coloca-se muito simples, ou seja, se o 25 de Novembro foi assim tão importante para a democracia portuguesa - como muitos dizem - por que raio só estão a celebrá-lo agora, 49 anos depois?
Eu digo-vos porquê. Porque até há bem pouco tempo, os partidos ditos democráticos e que albergaram a tralha fascista no pós-25 de Abril (o PSD e o CDS, principalmente, mas também o PS) não sentiram a necessidade - nem interesse - em mexer nesse ninho de vespas, não fosse o povo acordar e aperceber-se de quem eles realmente são. Mas agora que há um “novo” partido, que não sentiu a necessidade de esconder o que é e que tem 50 lugares no Parlamento, o chamado “bloco central” já sentiu a necessidade de sair da toca, rasgar as vestes de cordeirinhos democratas e mostrar a toda a gente de que eles é que são os fascistas originais. Portanto, dirão eles: “se é para eleger fascistas, continuem a votar nos mesmos, ou seja, em nós. No ‘bloco central’. Porque nós é que somos os verdadeiros fascistas. Moderados, mas fascistas. Democratas, mas fascistas, Enfim, somos aquilo que vocês quiserem. Vocês só têm que acreditar”.
E como o povo tem acreditado nesta gentalha fascista. Na direita fascista que não tem vergonha de o ser, na direita fascista encapotada e na “esquerda” que não é nem nunca foi esquerda. Estão lá todos, hoje, na “Casa da Democracia”.
Viva o 25 de Novembro! Viva o fascismo!