Se não passa na televisão, não existe
Os ataques das forças militares lideradas pela Arábia Saudita contra o Iémen – forças apoiadas pelos EUA - causaram a pior crise humanitária do mundo, segundo a Agência das Nações Unidas para os Refugiados. Esta guerra – que já dura há vários anos – intensificou-se no passado mês de Janeiro - o pior mês em termos de vítimas civis, desde que os combates começaram em 2014.
Após sete anos de guerra, o Iémen continua a ter a pior crise humanitária do mundo. Mais de quatro milhões de pessoas foram desalojadas de suas casas e mais de 20 milhões precisam urgentemente de assistência humanitária. Dezenas de milhares de pessoas encontram-se a morrer à fome, sendo que cerca de cinco milhões de pessoas estão a um pequeno passo de se encontrarem nessa mesma trágica situação.
A 21 de Fevereiro, a organização Médicos Sem Fronteiras informou que as forças sauditas bombardearam vários alvos na província de Hajjah, no noroeste do Iémen, matando e ferindo vários civis. Enquanto isso, jactos atingiram a cidade costeira de Hodeida. No dia seguinte, ataques aéreos e mísseis atingiram áreas residenciais nas províncias de Marib, Taizz e Saada.
No dia 24 de Fevereiro, precisamente no dia em que o exército russo invadiu a Ucrânia, o Iémen foi atingido por 37 ataques aéreos espalhados por todo o país, mas principalmente em Hajjah e Al-Bayda. No dia seguinte, os sauditas bombardearam Saada usando artilharia pesada e matando pelo menos seis civis. Saada tem sido um centro de derramamento de sangue há já algum tempo. Em Janeiro, os sauditas lançaram uma bomba guiada sobre um centro de detenção local, matando 91 pessoas e ferindo outras centenas.
A ONU estima que o número de mortos atingiu pelo menos os 377.000 até final de 2021. Os Estados Unidos são participantes directos nesta barbárie. Estima-se que os EUA – à conta deste massacre no Iémen - tenham vendido pelo menos 28 mil milhões de dólares em armas à Arábia Saudita, fornecendo treinamento e apoio a Riad, tanto militar quanto diplomaticamente, “ajudando” os seus amigos sauditas a continuar o derramamento de sangue.
Segundo relatórios da ONU e UNICEF, são inúmeros os episódios de ataques a escolas e hospitais, bem como a falta de assistência humanitária às crianças. A organização Save the Children reporta que só no período entre Abril de 2015 e Outubro de 2018 morreram cerca de 85.000 crianças à fome.
À catástrofe no Iémen podemos somar a da Síria e a da Somália. E, obviamente, não devemos esquecer nunca o regime de apartheid e violência que Israel impõe em Gaza.
Reparem que os líderes políticos do ocidente e respectiva comunicação social – sempre em linha - não tiveram qualquer pejo em classificar a invasão do exército russo como uma “ocupação”, algo que não são capazes de fazer em relação à ocupação israelita na Palestina. Para este tipo de gente, os ucranianos são combatentes, resistentes e heróis. Já os palestinianos são considerados “terroristas” por fazerem a mesma coisa. Esta diferença de tratamento é simplesmente doentia e nojenta.
Em relação ao actual conflito na Ucrânia, as objectivas mostram (durante todo o dia) a perspectiva da vítima, já em relação aos restantes conflitos – nas parcas vezes que são abordados – passam a visão e versão do agressor, que tem sempre um bom punhado de motivos para perpetrar os seus ataques.
E, já sabemos o que acontece a quem tenta mostrar o lado das vítimas - quando o agressor são os EUA e seus compinchas -, basta recordar o que fizeram a Julian Assange e Chelsea Manning.
E ainda há quem argumente que não interessa nada, agora, falar dos outros conflitos, porque isso é como se se estivesse a legitimar as acções de Vladimir Putin. É preciso muito descaramento, ou então ser-se muito estúpido. Portanto, os políticos, a comunicação social e, por arrasto, a maioria das pessoas ignoram as maiores catástrofes humanitárias do planeta, e quando alguém as traz para o debate ainda é acusado de estar a legitimar Putin. Isto só lembra mesmo ao diabo, ou então, a todos quantos passam a vida a legitimar a actuação dos gangsters de Washington e seus capachos.
Bem, para finalizar, resta-me apresentar as minhas desculpas por estar aqui a debitar mentiras. Nada do que aqui expus corresponde à realidade. Até porque se aquilo que acabei de referir fosse mesmo verdade passava na televisão, não passava?